Estudo de um dos mais respeitados neurocientistas do mundo mostra que é possível transformar esse incômodo estado em agente motivador.
“Não é o stress que nos mata, e sim a forma como reagimos a ele”, escreveu há exatos sessenta anos o endocrinologista húngaro Hans Selye (1907-1982) emStress — A Tensão da Vida. A máxima, hoje, pode provocar estranhamento, se levarmos em conta, por exemplo, que, segundo a American Psychological Association, o stress crônico está relacionado às seis maiores causas de morte nos Estados Unidos (doenças cardíacas, câncer, doenças pulmonares, acidentes, cirrose e suicídio). Ou ainda se considerarmos que, no Brasil, 72% das pessoas ativas no mercado de trabalho sofrem sequelas desse mal, de acordo com um levantamento realizado em 2015 pela International Stress Management Association. Mas e se em vez de prestarmos atenção somente nas consequências danosas do estado de stress reagíssemos a ele de um modo diferente, procurando “aproveitá-lo”, digamos assim, em nosso benefício? Seria isso possível?
Em The Stress Test (O Teste do Stress), livro publicado em junho na Europa e nos Estados Unidos e sem previsão de lançamento no Brasil, o neurocientista cognitivo irlandês Ian Robertson, fundador do Trinity College Institute of Neuroscience, diz que sim. E mostra o caminho das pedras, ou melhor: como caminhar sobre elas.
Desde os anos 1950, é consenso na comunidade científica que o stress prejudica a saúde. Em um estágio crônico, ele pode afetar o funcionamento do cérebro, suprimir a atividade da tireoide, diminuir a densidade óssea, aumentar a pressão sanguínea, enfraquecer a imunidade e causar desequilíbrio no nível de glicose no coração. Os estudos de Hans Selye, no entanto, identificaram dois tipos de stress: o “ruim” (distress), que tem efeito paralisador e depressivo, e o “bom” (eustress), que pode ser motivador e energizante. Décadas depois dos trabalhos do endocrinologista húngaro, já nos anos 1980, surgiram as primeiras evidências de que o cérebro não é um órgão imutável; ao contrário, ele se transforma a partir das experiências do indivíduo ao longo da vida. E, mais recentemente, estudos na área da epigenética confirmaram que o mesmo acontece com os genes: eles podem alterar sua atividade como forma de reação a estímulos externos (provocados pelo stress, por exemplo). Baseando-se nessas constatações científicas, Ian Robertson decidiu investigar se, controlando as emoções e pensamentos, qualquer um poderia transformar o vilão stress em um grande aliado.
Para avançar em sua tese, Robertson precisou estudar de maneira unificada o cérebro, classificado por ele como “hardware”, e a mente, que corresponderia, em sua definição, ao “software”. Segundo o neurocientista cognitivo — que trabalhou por anos como psicólogo —, foi justamente o foco “exclusivo” no software o responsável pelo “surto” de consumo de antidepressivos verificado nos últimos anos. “As pessoas recorrem a esses medicamentos quando não se sentem no controle de suas emoções e pensamentos”, disse Robertson a VEJA. “É preciso entender que nós somos os pilotos dessa máquina incrível que é o cérebro e, com a prática, podemos aprender a controlá-la, assim como podemos fazer com as emoções.”