Faltando exatos 39 dias do início dos Jogos Olímpicos de 2016, o Brasil – país anfitrião – tenta, em meio a uma crise política, focar as atenções em torno do evento. Mais de 10.000 atletas de, aproximadamente, 200 países vão participar e o mundo vai estar durante 17 dias (de 5 a 21 de agosto), com olhares voltados para a nação verde e amarela. Nessa hora, certamente, toda sujeira deve ser escondida embaixo do tapete, para evitar um vexame de repercussão internacional.
No entanto, o momento vivido pelo país, que já é ruim, pode ser agravado, justamente quando se tem a oportunidade de sediar, pela primeira vez, uma Olimpíada. Além dos sérios problemas internos, ligados a casos de corrupção que resultaram, inclusive, no afastamento da presidente da República; paira no ar uma preocupação: a possibilidade de o Brasil sofrer um atentado terrorista durante os Jogos.
Este risco não está sendo alardeado com a força necessária pela grande mídia, mas passou a ser considerada com maior relevância, pelas instituições que cuidam da segurança pública nacional, desde o último mês de abril, quando a Agência Brasileira de Inteligência (ABIN) confirmou a autenticidade de uma ameaça feita ao país por um integrante do Estado Islâmico — o mesmo grupo que reivindica uma série de atentados pelo Ocidente nos últimos dez anos.
Usando o seu perfil no Twitter, Maxime Hauchard, de 22 anos, terrorista francês que aparece decapitando sírios em vídeos divulgados pela internet, publicou uma semana após os atentados em Paris, em novembro de 2015, o seguinte recado:
“Brasil, vocês são nosso próximo alvo”.
ESPECIALISTAS DIVERGEM
O aviso pode ser um blefe, mas todo cuidado é pouco quando se trata de grupos que agem de forma inescrupulosa e sem piedade. Apesar disso, a ameaça não aflige a todos e a discussão apresenta pontos divergentes, inclusive, entre especialistas.
Em entrevista ao Aratu Online, o chefe de departamento de Relações Internacionais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Reginaldo Nasser, disse que um ataque terrorista contra o Brasil é possível, porém pouco provável, considerando que o país não é alvo dessas organizações.
Além disso, Nasser comentou que não existe histórico dando conta de que alguém cometeu um atentado e anunciou, antecipadamente pelo Twitter. E foi mais além, disse que a ABIN não tem muita capacidade e expertise para falar sobre o tema.
“A ABIN é piada pronta e os meios internacionais ficam ouvindo isso”, disparou, acrescentando que a intenção é alimentar o assunto para justificar a necessidade de angariar recursos para garantir a segurança nas Olimpíadas.
Tanto o recado do terrorista, quanto a credibilidade da agência são vistas de maneira diferente pelo coordenador da graduação em Relações Internacionais da Unijorge, Matheus Souza. “Considero o grau da ameaça entre médio e grande, especialmente porque a ABIN deu declarações, evidenciando tal possibilidade”, declarou, sustentando opinião divergente.
MUNIQUE – 1972
Uma possível ação terrorista no Rio de Janeiro não seria novidade em Olimpíadas, lembrou Souza, resgatando o ataque em Munique, nos Jogos de 1972, quando atletas israelenses foram sequestrados e mortos. No caso dos jogos no Brasil, ele observa que o ‘modus operandi’ do Estado Islâmico para ações em locais com grandes aglomerações, um eventual ataque seria diferente do que se viu naquela ocasião.
Esse é um dos pontos de convergência entre as avaliações de Souza e Nasser. O professor da PUC-SP também comparou o episódio de Munique com um possível atentado ao Brasil e explicou que, naquela oportunidade, o sequestro realizado por um grupo palestino (o Setembro Negro) tinha uma finalidade de negociação. “Agora, são ataques repentinos e simultâneos sem semelhança alguma com o que aconteceu”
Entretanto, Souza ressalta que não seria plausível descartar um ataque às pessoas que não fazem parte de delegações de atletas, assim como considerar que brasileiros não seriam alvos. “Neste sentido, o ódio ao Ocidente não discrimina. A agenda do Estado Islâmico é maior do que a agenda do Setembro Negro e suas ações refletiriam a magnitude de seus interesses”, avalia.
PRINCIPAIS ALVOS
Diante desse novo panorama do terror, a situação fica mais complicada, pois da mesma forma que locais considerados alvos aparentes, como as arenas e ginásios onde acontecerão os jogos, podem ser atacados, as ações também podem ocorrer em outros espaços com grandes aglomerações, como os hotéis, bares, boates, restaurantes, aeroportos e estações de metrô.
De acordo com Souza, experiência recente mostra que atentados podem acontecer em lugares não centrais para o evento esportivo. “Os ataques que ocorreram na sexta-feira 13, em novembro de 2015 na França, se deram em restaurantes, boates e bares, próximos ao estádio de futebol, onde estava sendo realizado um jogo da seleção francesa”, relatou.
Para ele, as dificuldades em prever alvos mais prováveis aumentam se levarmos em consideração a ação dos chamados ‘lobos solitários’ – simpatizantes do Estado Islâmico sem vínculos tão estreitos com a organização terrorista – que podem agir de modo independente.
O entendimento é o mesmo de Nasser. A lógica dos ataques, segundo ele, é acontecer em locais de grande fluxo e circulação de pessoas, normalmente onde se tenha grande visibilidade. “As delegações, podem ser alvos, mas à medida que elas são bem protegidas, se torna pouco provável que isso aconteça”, ponderou.
RIO DE JANEIRO E SÃO PAULO
Além do Rio de Janeiro, cidade que sedia oficialmente os Jogos Olímpicos em 2016, cinco capitais brasileiras vão participar do evento, onde acontecerão partidas de futebol. Há jogos previstos para serem realizados em São Paulo, Brasília, Belo Horizonte, Manaus e Salvador.
Os especialistas concordam que o risco de um ataque terrorista não são iguais para qualquer cidade. O professor da Unijorge entende que o Rio de Janeiro é a principal vitrine, não só por receber todas as competições, mas pela projeção internacional que possui.
“A própria ABIN classificou os municípios – quando da passagem da tocha olímpica – em diferentes graus de sensibilidade (alto, médio e baixo). Portanto, não penso que Salvador estaria tão visada quanto o Rio, apesar de não descartar a possibilidade de ataque”, informou.
Pela mesma linha, segue o pensamento de Nasser, quando faz uma referência à cidade de São Paulo. Ele explica que os terroristas agem com uma certa cumplicidade da mídia, no tocante à visibilidade. Dessa forma, “vale mais um ataque na Avenida Paulista, ainda que seja pequeno, do que um grande ataque na periferia de São Paulo”, avaliou.
É fato que o Brasil não possui histórico de ameaças ou ações de organizações terroristas internacionais, mas os dois especialistas concluem que isso não é motivo para dar brechas. Ambos, apesar de crerem na possibilidade em probabilidades diferentes, reforçam que a realização de qualquer evento que desperte a atenção da imprensa mundial é um momento propício a um ataque terrorista.
ESTRATÉGIAS DE DEFESA
Independente da possibilidade de um indesejável atentado terrorista, as autoridades brasileiras garantem que todas as providências estão sendo tomadas para garantir a segurança dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos Rio-2016. O Estado Maior-Conjunto das Forças Armadas (EMCFA), comandado pelo almirante Ademir Sobrinho, está à frente das atividades da Defesa Nacional e conta com uma estratégia montada com o apoio dos eixos de Inteligência e Segurança Pública.
Recentemente, nos dias 21 e 22 de junho, representantes de todos os órgãos envolvidos na segurança do grande evento internacional participaram de um encontro realizado no Comando Militar do Planalto (CMP), em Brasília, para debater os principais pontos do planejamento que visam assegurar a tranquilidade de brasileiros e estrangeiros nas Olimpíadas.
De acordo com a assessoria do Ministério da Defesa, na oportunidade, o general Mauro Sinott, do Comando Conjunto de Prevenção e Combate ao Terrorismo (CCPCT), destacou que contará com a atuação exclusiva de aproximadamente 2 mil militares, sendo 1,2 mil deles somente no estado do Rio de Janeiro, que concentrará o maior número de competições e, consequentemente, de visitantes.
Os representantes dos Comandos de Defesa de Área (CDA) das cidades onde serão realizadas competições do futebol também estiveram no encontro e apresentaram os seus planejamentos, que levam em conta as especificidades regionais e, dessa forma, puderam compartilhar as informações e aperfeiçoar o planejamento das operações.
SALVADOR
Em Salvador, o Centro de Coordenação de Defesa de Área (CCDA) está sob o comando do 2° Distrito Naval e contará com a atuação de uma Força Naval e de uma Força Terrestre Componente, além de Forças Especiais da Marinha do Brasil, coordenadas pelo EMCFA. Uma Célula de Operações Aéreas (COA) controlará o emprego de aeronaves, sob a coordenação do Comando de Defesa Aeroespacial Brasileiro e do Departamento de Controle do Espaço Aéreo da FAB.
Segundo a assessoria de comunicação social do Comando do 2° DN, as tropas do Exército – na Força Terrestre Componente – atuarão na defesa das estruturas estratégicas espalhadas pela Região Metropolitana de Salvador e estarão em prontidão para, em caso de necessidade, atuarem como Força de Contingência. Além disso, navios e embarcações da Marinha executarão Patrulha e Inspeção Naval no litoral da capital baiana e no interior da Baía de Todos os Santos.
Ainda de acordo com o Comando do 2° DN, as Forças Armadas esperam e trabalham para que os Jogos Olímpicos transcorram em um clima de segurança e tranquilidade, mas não desconsideram eventuais ameaças e buscam se preparar sempre para os piores cenários.
A capital baiana terá à disposição um Grupamento Operativo de Fuzileiros Navais, especializado em defesa contra agentes Químicos, Biológicos, Radiológicos e Nucleares (QBRN), além de elementos de forças especiais da Marinha, como Comandos Anfíbios e Mergulhadores de Combate. Os efetivos militares que estarão em Salvador podem ser empregados em varreduras QBRN, retomada de instalações, resgate de reféns, tiro de precisão, inteligência, reconhecimento e vigilância.
No último dia 7 de abril foi realizado na Arena Fonte Nova (palco dos jogos em Salvador) uma simulação de ataque terrorista, quando equipes e equipamentos de segurança e da área médica foram testados. A atividade durou toda a manhã e contou com participação de estudantes do curso de Enfermagem da UNEB caracterizados como vítimas recebendo atendimento pré-hospitalar de diversos profissionais.
Houve também a participação do BOPE (Batalhão de Operações Especiais) que atuou com a Marinha na localização, classificação e desativação de artefatos explosivos utilizando inclusive um robô antibomba de alta tecnologia com detector de gases tóxicos e substâncias explosivas e aparelho de raio X portátil de tempo real.
A atividade envolveu vários órgãos de segurança pública e defesa civil a exemplo da Comitiva Nacional de Energia Nuclear-Pernambuco, Exército, Marinha, PF, PRF, Polícia Militar da Bahia, DPT, Secretaria de Segurança Para Grandes Eventos – SESGE, Transalvador, SAMU, Guarda Municipal, dentre outras.