Para Ministério da Saúde, veto reduz riscos de contaminação por HIV; ação do PSB com apoio de ONGs e da PGR diz que medida é discriminatória e viola Constituição; Supremo julga nesta quinta.
Atualmente, um homem heterossexual que tenha feito sexo sem camisinha pode doar sangue no Brasil, enquanto um homossexual que use preservativo fica vetado de doar pelos 12 meses seguintes à sua última relação sexual.
O Ministério da Saúde introduziu a norma com a justificativa de reduzir o risco de contaminação por HIV em uma transfusão. A Procuradoria-Geral da República, a Ordem dos Advogados do Brasil e ONGs são contra a medida e apoiam uma ação, levada ao STF, que questiona sua constitucionalidade.
E é esta ação que o Supremo Tribunal Federal deve julgar nesta quinta-feira. O tema é polêmico e o STF deve se debruçar sobre várias questões.
A restrição ao sangue de um homossexual fere a dignidade humana? Impede o exercício da cidadania? É razoável e proporcional ao seu objetivo? Há outra forma de fazer isso? Afinal, é discriminação?
Contágio
Fazer sexo sem camisinha é a causa da maioria absoluta de casos de HIV no país: é o motivo apontado pelo Ministério da Saúde para 81,7% das 136.945 infecções pelo vírus em pessoas maiores de 13 anos reportadas entre 2007 e junho de 2016 ao Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan).
Heterossexuais representaram 36,7% dos homens brasileiros contaminados nos primeiros seis meses do ano passado – eram 47,3% em 2007. Homossexuais e bissexuais responderam por 59,5% dos novos casos de janeiro a junho de 2016 – eram 43,8% em 2007. Entre as mulheres, 95,9% ocorreram em relações heterossexuais.
O Ministério da Saúde e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), apoiados pela Advocacia-Geral da União e por diretores de hemocentros brasileiros, argumentam que o veto temporário à doação por homens gays se baseia em estudos científicos sobre o “perfil epidemiológico dos grupos e situações, constatando aumento do risco de infecção em determinadas circunstâncias” envolvendo esses homens.
Não é o que acredita o PSB, partido autor da ação direta de inconstitucionalidade nº 5543, e outras organizações que também pedem o fim da medida, entre elas a Procuradoria-Geral da República, a Defensoria Pública da União, o Ordem dos Advogados do Brasil e grupos de defesa de direitos de lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros (LGBT).
O PSB diz que, na prática, a norma impede que homossexuais doem sangue de forma permanente e que isso revelaria um “absurdo tratamento discriminatório por parte do Poder Público em função da orientação sexual”.
O advogado Rafael Carneiro, que assina a petição do partido, defende que a política “ofende a dignidade humana e gera discriminação”. “O maior risco de contaminação decorre da atividade sexual, não da orientação homossexual. Um heterossexual também pode ter relação anal sem camisinha e estar sujeito ao mesmo perigo que um homossexual.”
Além, disso, diz o partido, por causa do veto, “19 milhões de litros de sangue deixam de ser doados anualmente”.
Em parecer assinado por Rodrigo Janot, a Procuradoria-Geral da República argumenta que a medida fere a liberdade individual, não é razoável e veta de forma definitiva na prática essas pessoas de doarem ao exigir abstinência sexual por um ano, dando munição à homofobia e estigmatizando mais grupos que já são discriminados.
Janot disse ainda que autoridades de saúde se omitem ao não “adotar mecanismos menos gravosos” para garantir a segurança do material doado: “Nem mencionam o uso de preservativo em relações sexuais como critério de seleção de doadores, método com maior eficácia para evitar contágio”.
Fonte: davidfont2016.jusbrasil.com.br