Tiago Leifert na estreia do BBB 17; antecessor, Pedro Bial nem foi citado no programa
Assistir à estreia de Big Brother Brasil 17, sem Pedro Bial, me espantou. O reality da Globo, em longa carreira, tinha no jornalista um contraponto entre a bobeira geral e uma certa credibilidade. Como se a porcaria se submetesse, de certa forma, ao padrão de qualidade da emissora do Jardim Botânico, em tempos em que o Projac ainda não estava finalizado.
Bial emprestava ao programa um ar de ironia e irreverência, como a dizer: “Vocês são isso mesmo?”. Criticava os concorrentes, fazia questionamentos parecidos com aqueles que qualquer espectador faria. Dava ao programa um verniz de coisa relevante. Além de prêmios consideráveis, em dinheiro e em produtos.
O BBB sempre foi um sucesso comercial, mas de audiência declinável ao longo dos anos. Nem sei o resultado dessa nova temporada. O fato é que fatura em patrocínios e na exposição de produtos comerciais nas provas de líder e outras versões subliminares de publicidade. Uma marca aqui, outra ali. Tudo em grana à vista. No entanto, até do ponto de vista comercial, foi se acadelando. A ponto de não ser possível discernir se ainda vale à pena. Sob pena de constranger o padrão da emissora. E será que tal padrão, na era pós-Boni, ainda vale?
Convivi com o Pedro Bial no Globo Repórter. Nunca fomos chegados, mas tenho dele uma recordação inarredável. Durante a guerra da Bósnia, se deslocando em Sarajevo, no interior de um blindado das Nações Unidas, com colete à prova de balas, Bial entrevistou um franco-atirador sérvio. O cara ficava sentado num banquinho matando qualquer pessoa que passasse por uma ponte. O assassino e Bial travaram um diálogo insólito:
– Quantas pessoas você matou? – perguntou Bial.
– Acho que foram umas dez. Não… acho que foram umas cem… Sabe de uma coisa? Estou enlouquecendo – disse o atirador.
Essa qualidade de jornalista foi escolhida para comandar o BBB por uma razão muito simples: dar alguma credibilidade ao pior reality do país. O próprio repórter, em notas na mídia, declarou que jamais seria um concorrente do espetáculo de bobagens que comandava.
No entanto, a ausência do Pedro Bial causa enorme dano. Ele não é facilmente substituível. Tratava os competidores com mordacidade, sugeria que eram uns completos imbecis. Fazia com que o público se identificasse com a sua opinião. E nisso estava a essência do programa: somos idiotas, mas nem tanto. E as reações do público coincidiam com a do apresentador.
Além do mais, Bial criava textos poéticos, quase literários, para definir vencedores. Passar por esta 17ª versão do game, sem ele, será um desastre.
CARLOS AMORIMé jornalista. Trabalhou na Globo, SBT, Manchete, SBT e Record. Ocupou cargos de chefias em quase todos os telejornais da Globo. Foi diretor-geral do Fantástico. Implantou o Domingo Espetacular (Record) e escreveu, produziu e dirigiu 56 teledocumentários. Ganhou o prêmio Jabuti pelo livro-reportagem Comando Vermelho – A História Secreta do Crime Organizado. É autor de CV_PCC – A Irmandade do Crime e O Assalto ao Poder. Criou a série 9mm: São Paulo, da Fox.
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