Ter a conta banida em um jogo online pode ser frustrante. São horas de jogatina, experiência acumulada e até bens virtuais adquiridos – com dinheiro de verdade, perdidos em bloqueios de conta geralmente irreversíveis. Geralmente.
O Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) determinou em liminar na última segunda-feira (5) que a Garena no Brasil reverta o banimento de uma jogadora baiana no Free Fire, jogo de tiro e sobrevivência para celulares que tem um forte cenário competitivo no mundo.
Ana Paula Alves teve a conta suspensa permanentemente e o acesso ao jogo pelo celular bloqueado por suposto uso de aplicativos de terceiros para obter vantagens em partidas. A desembargadora do caso, Maria do Rosário Passos, entendeu que a desenvolvedora do programa não deu direito de defesa a Ana Paula, muito menos ofereceu provas da conduta.
Na decisão liminar, a Justiça determinou que a Garena reative a conta em até 15 dias úteis, sob pena de multa diária de R$ 200. A jogadora deve ter acesso ao jogo até a análise final do caso. A desembargadora também acatou o argumento da defesa de que Ana Paula teve reputação prejudicada pelo banimento e rotina de prática interrompida.
Ana Paula mantinha a conta no Free Fire há dois anos, buscava a profissionalização e foi ranqueada com mestre, assumindo a posição entre os 1% dos melhores jogadores. O cenário competitivo do jogo tem premiações que podem chegar a R$ 1,5 milhão.
A desenvolvedora considera como trapaça, sob pena de banimento, o uso de APKs, macros, softwares ou outro tipo de mecânica que possa dar vantagens a jogadores. Por isso, utiliza sistemas automatizados para procurar pelas irregularidades entre a grande base de jogadores.
JUDICIALIZAÇÃO DOS GAMES
Uma série de outras decisões similares contra empresas que gerem jogos online vem ocorrendo no Brasil, como em São Paulo, Distrito Federal e Rio de Janeiro. Os processos têm revertido banimentos e ampliado a discussão sobre o direito do jogador excluído por sistemas criados para identificar e punir quem trapaceia.
Sócio do escritório que defendeu Ana Paula e tem se especializado em defender os direitos de consumidor de jogadores brasileiros, Pedro Bohrer Amaral disse ao Bahia Notícias que o uso de algoritmos para realizar os banimentos ajuda as desenvolvedoras a lidarem com o alto número de jogadores, mas prejudica muitos ao longo do processo.
“Vivemos em uma ditadura do algoritmo, em que muitas vezes são criadas regras dentro de códigos que falham em identificar determinadas condutas. O indivíduo é acusado, julgado e punido de forma imediata pela máquina, sem qualquer tipo de análise individualizada realizada por um ser humano. O resultado é uma total falta de transparência por parte dos desenvolvedores de jogos, que não conseguem informar de forma clara a conduta específica sendo sancionada”, declarou Bohrer.
Em junho deste ano, a Garena anunciou o banimento de mais de dois milhões de contas no Free Fire em uma operação de combate a hackers. Os banimentos foram apresentados em relatório em que a desenvolvedora introduziu um sistema antitrapaça para garantir a saúde das partidas online.
Procurada pelo Bahia Notícias, a Garena não comentou se vai cumprir a decisão da Justiça e alegou que não comenta casos específicos, visando a privacidade dos jogadores. À liminar, cabe recurso pela empresa.
COLHEITA FELIZ
Processar empresas que administram jogos online não é novidade no Brasil, apesar do crescimento recente da procura pela Justiça em tempos em que cada vez mais jogadores buscam a profissionalização da jogatina.
Em 2013, a youtuber Tulla Luana viralizou com vídeo em que apareceu prometendo processar a Paymentez, empresa responsável pelo jogo Colheita Feliz – sucesso na época do Orkut – por não especificar a data de término de uma promoção paga dentro de um evento do simulador de fazenda.
Anos depois, em 2019, a empresa Activision Blizzard Brasil teve que pagar R$ 5 mil a um jogador do World of Warcraft que foi banido por conduta suspeita após ter passado mais de dez horas seguidas conectado ao jogo.
Fonte:https://www.bahianoticias.com.br/