Descontado o aluguel do carro – para aqueles que não têm o táxi próprio -, o faturamento médio de um taxista em Salvador era de R$ 3 mil por mês, segundo os profissionais. Faz pouco mais de dois anos que esse valor caiu para, no máximo, R$ 1 mil. Os motoristas dos 7,2 mil táxis da capital atribuem os problemas à ‘queda da praça’ – pouca procura pelo serviço, além da estabilidade dos aplicativos, já estabelecidos e regulamentados em Salvador.
Se, para alguns profissionais, a solução pode estar na possibilidade de também se cadastrarem nos aplicativos, há quem não espere por isso. Para um grupo de taxistas que formam fila no Terminal Náutico, no Comércio, a saída foi aposentar o equipamento característico do serviço pioneiro: o taxímetro.
Formado por 33 motoristas – dos 40 que ficam no ponto da região -, o Táxi Terminal Náutico começou a seguir a lógica dos aplicativos: no lugar de corridas sem previsão de valores, uma tabela com preços estabelecidos para, pelo menos, 70 bairros e localidades de Salvador.
“O que a gente busca é tirar o medo que alguns passageiros têm do taxímetro. De entrar na corrida sem saber quanto vai gastar. Muita gente ainda confia mais nos taxistas, sabe que tem o cadastro, a fiscalização da prefeitura, mas tem essa questão do preço”, explica um dos líderes do grupo, Clôdes Carvalho, taxista há oito anos, que percebeu uma queda de pelo menos 80% na quantidade de corridas desde que os aplicativos se estabeleceram.
Carvalho conta, ainda, que muita coisa mudou por conta da redução na renda: “Antes, eu conseguia investir em cursos de idiomas, no carro, em conforto para os clientes. Hoje, a gente não tem mais como fazer isso. Primeiro porque não podemos deixar de rodar para estudar, nem dá para investir nessas coisas porque só tiramos o dinheiro para o sustento em casa”.
Antes da entrada da concorrência e de o orçamento mudar, ele conseguiu estudar inglês, francês e espanhol pagando cursos com a renda que tirava das corridas.
A iniciativa passou, inclusive, pela análise e autorização da Secretaria Municipal de Mobilidade de Salvador (Semob).
“A tabela foi conferida e os preços estão abaixo do taxímetro. Legalmente, eles podem cobrar menos que o taxímetro, nunca mais”, explica o titular da pasta, Fábio Mota.
O secretário destacou, ainda, que a iniciativa é vista com bons olhos pelo poder público municipal. “Nós incentivamos porque a ideia é melhorar a qualidade do serviço de táxi. É uma iniciativa que não é nova, é o mesmo método que utilizamos no Carnaval. Tem outros grupos fazendo também, mas lá no Terminal Náutico eles estão bastante organizados, fardados, a grande maioria participou do curso básico de inglês oferecido pela prefeitura alguns anos atrás”, completa.
Por toda a cidade
A iniciativa dos motoristas abrange 75 bairros da capital baiana, que têm os valores tabelados. Fazenda Grande do Retiro, Garcia, Liberdade, Nazaré e outras localidades próximas, mas também endereços mais distantes, como Boca do Rio, Águas Claras, Cajazeiras e até o Aeroporto de Salvador estão na lista.
Com base no taxímetro, por exemplo, uma corrida para o aeroporto custaria próximo de R$ 100, partido daquela região da Cidade Baixa. Na tabela do grupo, que não dá distinção de horários, o passageiro pagaria R$ 60.
De acordo com o taxista auxiliar Luiz Guilherme do Carmo, 44 anos, o novo modelo deu bons resultados na primeira semana de implementação, no final do mês.
“Nosso tempo de espera, desde que os aplicativos chegaram, aumentou para três, até quatro horas na fila. Raramente, fazíamos mais de três viagens. Só no primeiro dia com a tabela, eu fiz cinco”, conta ele, no ramo há seis anos.
Hotel
Apesar de ter sido implementado há menos de 15 dias, o projeto vem sendo pensado há mais de um ano. “Passamos um tempo para convencer os colegas, para eles entenderem que valeria a pena, que a quantidade de corridas ia aumentar. Precisamos criar novas maneiras para captar o cliente”, explica.
O grupo se inspirou nos preços tabelados praticados por um hotel da região. “Só que o hotel pensa só nos turistas. A gente atende aos turistas, mas pensa também no soteropolitano, em quem mora aqui, mas vai trabalhar na ilha, ou mora na ilha e precisa vir”, completa.
Uma dessas clientes baianas, que já aprovou a iniciativa do grupo, foi a enfermeira aposentada Ligia Lemos, 72. Moradora da Ilha de Itaparica, ela vem a Salvador com frequência para consultas médicas, visitas ao banco, ou mesmo passeios no shopping. Quando desembarca no terminal náutico, a aposentada depende de caronas ou de táxi para se deslocar.
“Por conta da idade, não gosto de depender de ônibus. Prefiro pegar um carro. Da última vez que tinha ido de táxi, paguei R$ 50 reais até a Pituba”, lembra. Com a corrida tabelada, pagou R$ 35 para o mesmo destino. “Eles também são muito atenciosos, eu gostei muito, vou recomendar pra todos”, elogia.
“Os clientes têm realmente gostado, porque a tabela é usada sem distinção. Não tem bandeira 2, nem influência do engarrafamento. É independente do dia, horário ou trânsito, sempre o mesmo valor. Acho que por isso que dá certo”, explica o taxista Carlos Rodrigues, 63.
Além do preço fixo, todos os membros usam uma farda e um adesivo no carro para identificá-los. “A gente entende que eles não são só passageiros que entram no carro, fazem o trajeto, pagam e nunca mais vamos ver. São clientes, a gente quer fidelizá-los”, diz Clôdes.
Mais iniciativas
Usar o preço tabelado ou pensar maneiras diferentes para atrair o passageiro de volta aos táxis não é exclusividade do grupo de taxistas do Terminal Náutico de Salvador. Iniciativas para tentar atrair os clientes de volta ao sistema de táxis tem acontecido em diversos grupos. “A chegada dos aplicativos nos trouxe também benefícios porque nos mostrou onde estávamos errando em nosso serviço, onde podemos melhorar”, declara Leonardo Galhardi, diretor financeiro da Ligue Táxi e presidente do consórcio União Táxi.
O consórcio reúne seis cooperativas de táxi da capital baiana: Ligue Táxi, Use Táxi, Tele Táxi, Pop Táxi, Rodo Táxi e Chame Táxi. Juntas, as cooperativas somam algo entre 1,5 mil e 2 mil carros e têm tomado algumas iniciativas para buscar mais corridas. “Para os associados, taxistas, temos buscado parcerias para reduzir os custos. Estamos também rodando com o aplicativo Táxi Mobi”, explica Leonardo.
No aplicativo, lançado pela prefeitura em abril deste ano, os preços das corridas têm desconto de 20% sobre o valor cobrado pela bandeira 1 do taxímetro, além de mostrar o preço do trajeto antecipadamente. “Juntando vários taxistas, eu consigo fazer frente aos aplicativos. Por estarmos juntos, conseguimos atender às demandas mais rápido e dar um preço menor ao consumidor”, completa o presidente do consórcio.
Outra cooperativa que tomou a mesma iniciativa, a Elitte Táxi também passou a oferecer, no último dia 31, desconto de 20% nas corridas. “Nós estamos começando um movimento forte para atrair o cliente de novo. Fomos buscar entender o porquê de os clientes terem migrado para os aplicativos e vimos três motivos: preço mais baixo, valor fixado e pagamento direto no aplicativo”, diz o sócio diretor da empresa, Marcos Gondim.
Diante desses fatores, a empresa passou a oferecer o desconto para os passageiros que solicitarem a corrida em seu aplicativo próprio, onde o passageiro pode ainda ter acesso ao valor que será pago.
MEI
Se tornar um Microempreendedor Individual (MEI) pode ser outra opção para que os taxistas se sintam mais seguros diante da redução no número de corridas. Se cadastrando na modalidade, o motorista vira um empresário com direito a CNPJ e com benefícios da previdência.
“A atividade do taxista está inclusa na lista de atividades que podem se cadastrar para constituir o MEI. O taxista se torna um empresário, pode emitir nota fiscal, tem CNPJ”, explica a analista do Sebrae, Valquiria Pádua.
Para se transformar em MEI, o motorista pode se cadastrar online e passar a fazer o pagamento mensal de uma contribuição que corresponde a 5% do salário mínimo. O valor (R$ 49,90) recebe o acréscimo de R$ 5 a título de ISS. Caso o taxista resolva pagar a previdência como contribuinte individual, o valor será de 11% sobre a remuneração mínima.
Além da contribuição mais em conta, o MEI dá ao taxista direito a alguns benefícios previdenciários. “Como MEI, o profissional tem direito a auxílio doença em caso de acidente, aposentadoria por idade. Se for mulher, tem auxílio maternidade, por exemplo”, elenca a analista.
Entre as limitações, o MEI não pode faturar mais de R$ 81 mil por ano – e a quantia deve ser declarada anualmente sob pena de multa. Não pode também ter sócio, podendo contratar apenas um funcionário desde que siga a legislação trabalhista.
Fonte: https://www.correio24horas.com.br